terça-feira, novembro 06, 2007

Já não há heróis

Naquela carruagem, não se viu um gesto nem um protesto, não se ouviu um grito nem um alerta. Todos os passageiros continuaram placidamente sentados e tranquilos nos seus lugares, sem que aquela agressão parecesse violentar a sua consciência, ou ofender a sua humanidade. Nenhum deles se sentiu obrigado a intervir, a dizer uma palavra ou a esboçar um movimento que fosse para travar o canalha, que mais tarde se desculpou com a bebedeira e que a polícia acabou por mandar em paz.

Fernando Madrinha in Expresso - 27.10.2007

Espanta-me a ingenuidade de Fernando Madrinha. Será que vive no mesmo mundo que eu? Ainda acredita na fraternidade e no amor ao próximo?

Pois é, estamos chegados à era do "desemerda-te". Estás com uma faca ao pescoço? Não reajas, cede. És vítima de extorção? Cala-te. Estão-te a dar pontapés? Pensa que é só um sonho mau, pois ninguém em teu redor quer levar um por ti. Não há heróis.

Ser herói implica morrer na miséria como Aristides Sousa Mendes, ou cair do esterlato para a padaria, como Zé Maria.

O individualismo a que as nossas sociedades chegaram dá nisto. Não queremos responsabilidades, somos impessoais, pouco comunitários e amigos do próximo. Mesmo que filmes, religiões, política passem a mensagem que "não seres apenas um número" é o mais importante.

Para os que acreditam que essa coisa do comunitário prejudica gravemente a saúde: saibam que a humanidade assim cresceu. Sozinhos, nós humanos tinhamos-nos extinguido.

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